Fobias: o medo está fora do controle!
Estudos pelo mundo apresentam um resultado que assinala algo em torno de 25% da população ligada, de alguma forma, ao medo fóbico. Esse distúrbio pode atingir até duas vezes mais mulheres
Por João Oliveira
“Provisoriamente não cantaremos o amor, que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos. Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços, não cantaremos o ódio, porque este não existe, existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro, o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos, o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas, cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas, cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte.
Depois morreremos de medo e sobre nossos túmulos nascerão ores amarelas e medrosas.”
Carlos Drummond de Andrade
O medo é inerente ao ser humano. Sentimos medo quando algo ameaça a nossa sensação de estabilidade, o nosso equilíbrio. As reações ao medo podem ser as mais adversas: enfrentamento, fuga ou entrega. Você já deve ter ouvido: “enfrentei o problema com a cara e a coragem”, “nem pensei, quei com medo e saí correndo” ou “paralisei de medo”. Ter medo é uma questão natural e valida o nosso instinto de sobrevivência. A fobia é um medo exacerbado e desproporcional, que prejudica os relacionamentos sociais.
O termo fobia signica um medo desproporcional relacionado a objetos, situações ou comportamentos de tal monta que é considerado um distúrbio psicológico. Uma hipersensibilidade que desencadeia grande ansiedade, tornando a situação um agente estressor capaz de gerar sensações de medo e pavor em níveis tão altos que podem modi car de forma prejudicial o comportamento social de uma pessoa. Desse modo, a fobia pode causar perdas e limitar o sujeito fóbico em suas ações, podendo mesmo imobilizá-lo ou promover o surgimento de sintomas ainda mais graves com doenças psicossomáticas.
Existem estudos pelo mundo que apresentam um resultado que assinala algo em torno de 25% da população ligada, de alguma forma, ao medo fóbico. Esse extrato teve, tem ou terá, em algum momento da vida, um episódio de fobia. Os estudos também indicam, com um pouco de incerteza, que esse distúrbio atinge duas vezes mais mulheres que homens. O per l de fobia mais comum é o horror de se sentir objeto de observação e avaliação pelo outros, a fobia social!
Sintomas presentes na fobia Alguns sintomas são de ordem subjetiva, como a apreensão, preocupação desmedida, previsão de ameaças e sensações de medo mesmo sem o objeto ou situação estressora, o que torna a vida do indivíduo fóbico, dentro deste processo, um verdadeiro inferno. Sem o tratamento adequado, muitas vezes, ele tem de adaptar sua vida para evitar o confronto e suas consequências fisiológicas e subjetivas. |
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A fobia simples diz respeito ao medo intenso restrito a situações específicas, como a presença de animais, fenômenos da natureza, avião, ir ao dentista ou hospitais etc. Também envolve a preocupação sem a presença do elemento estressor
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Mecanismo de defesa
Segundo Jung, todo sintoma é uma tentativa de autocura do corpo. Nesse modo de pensar, o transtorno de ansiedade, base primeira da fobia, deve estar servindo como um elemento de proteção agindo de forma a preservar o corpo de alguma ameaça que, pela perspectiva do inconsciente, pode ser extremamente danosa. Esse mecanismo de defesa difere dos outros transtornos de ansiedade, pois tem uma característica especial: só se manifesta em situações particulares. Estas podem ser divididas em dois grandes grupos, como podemos encontrar na quarta edição do Manual Diagnóstico e Estatísticas dos Transtornos Mentais (1995), o DSM-IV, onde as fobias são assim quali cadas:
1) FOBIA ESPECÍFICA: antes denominada “fobia simples”, diz respeito a medos intensos, restritos a situações especí - cas, que podem ser claramente discerníveis como: a presença de animais, fenômenos da natureza, avião, ir ao dentista ou hospitais etc. Também pode envolver a preocupação acerca do objeto, ou seja, sentir o medo irracional mesmo sem a presença do elemento estressor.
2) FOBIA SOCIAL: a característica essencial é um medo acentuado e persistente de situações sociais ou de desempenho nas quais o individuo pode sentir embaraço. Como exemplo: falar, comer, escrever em público ou ir a festas. Um estudo mostrou que 20% das pessoas citavam medo excessivo de falar em público, mas apenas 2% se encontravam dentro do per l da fobia social. Mesmo assim, falar em público aparece em primeiro lugar entre as fobias sociais.
A fobia é um medo exacerbado e desproporcional, que prejudica os relacionamentos sociais
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Já a fobia social se caracteriza pelo medo acentuado e persistente de situações sociais, como ir a festas. Falar em público aparece em primeiro lugar entre esse tipo de fobi
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Medo é uma das emoções primárias do homem e surge no processo evolucionário como um alerta ao perigo. Ele pode evoluir para a raiva e transformar o sujeito numa máquina de agressividade ou para o pavor e fazer com que ele fuja do combate. Então, o medo é uma forma de ansiedade ou estamos usando palavras diferentes para a mesma sensação? Este é um problema semântico e enfrentaremos vários quando se trata de emoções, isso porque possuímos muitas nuances emocionais diferentes e, para di cultar um pouco mais, podemos sentir mais de uma ao mesmo tempo, o que iria necessitar de um cabedal com 10 mil palavras só para nominar as expressões faciais resultantes dessas emoções.
Já a fobia é o medo irracional, além da medida apropriada, para se tomar uma decisão. Dura mais tempo que o medo normal e provoca uma forte produção hormonal, altera o batimento cardíaco, inicia um processo de sudorese, altera o sistema digestivo e respiratório e, quando excessivo, pode até levar ao desmaio, uma forma extrema de fuga à situação. Além disso, o objeto desse medo intenso pode não ser tão signi - cante assim para a maioria das pessoas. Assim, uma característica da fobia é uma grande desproporção entre a emoção e a situação que a provoca, sem que tenha uma explicação razoável para isso, com ausência de controle voluntário e uma tendência à evitação dessa situação a qualquer custo.
A diferença entre fobia e medo é quantitativa: de tempo e intensidade!
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• Etimologia • |
Filogenética
Durante a evolução, algumas “predisposições logenéticas” (SELIGMAN, 1970) selecionaram comportamentos de evitação para a sobrevivência das espécies. Essa proposta explica uma universalidade de alguns medos, que podem passar a fóbicos, por alguma experiência traumática ou não. Em verdade, existe uma forte vulnerabilidade constitucional que predispõe as pessoas a desenvolverem transtornos de ansiedade em relação a esses medos que já vêm implantados em nossa memória genética, tais como: insetos, lugares altos ou fechados, animais predadores, escuridão, água e fogo, situações ou elementos que podem causar dano letal. As fobias relacionadas a esses gatilhos seriam, por assim dizer, mais naturais, pois bastaria apenas uma experiência mais forte para ocasionar o processo de surgimento de uma verdadeira fobia.
Isso facilita entender por que alguém que nunca teve um contato direto com o mar possa sentir medo diante da visão, pela primeira vez, da imensidão azul. Existe um programa rodando dentro do cérebro, preinstalado, que alerta sobre o perigo do afogamento. Após se sentir seguro – aprender a nadar ou adquirir uma boia –, este processo de evitação pode ser diminuído ou totalmente extirpado. Caso contrário, se, em alguns casos, ocorre um evento que quali que a água como real perigo, o medo será intensi cado a ponto de poder se transformar em uma fobia. Naturalmente, acreditamos, deve valer para todos os objetos e situações previstas como de risco pela nossa aventura evolucionária.
*Continua na próxima postagem.